No último dia 06 de setembro, o presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória 1068/2021, que provocou muita discussão no cenário brasileiro e mundial, discussões estas que tangenciam direitos fundamentais como a liberdade de expressão, além de temas como fake news e discursos de ódio. A MP traz alterações à importante Lei nº 12.965/2014 - o Marco Civil da Internet, bem como à Lei nº 9.610/98 - Lei dos Direitos Autorais.
Do ponto de vista da legalidade da MP, ressalta-se que o art. 62 da Constituição Federal que trata da edição de Medidas Provisórias determina que as medidas provisórias somente poderão ser adotadas em caso de urgência ou relevância, o que não fica demonstrado no caso, além de estabelecer vedação à medida provisória que trate de matéria relativa a direitos políticos, direito penal, direito processual penal e direito civil.
O foco da MP é a moderação de conteúdos nas redes sociais e as principais alterações estão concentradas nos artigos 8º-B e 8º-C.
Segue um resumo das principais mudanças a serem observadas:
1. Inclusão de novos direitos dos usuários de redes sociais (art. 8º-A):
V - não exclusão, cancelamento ou suspensão, total ou parcial, de serviços e funcionalidades da conta ou do perfil, exceto por justa causa, observado o disposto no art. 8º-B;
VI - não exclusão, suspensão ou bloqueio da divulgação de conteúdo gerado pelo usuário, exceto por justa causa, observado o disposto no art. 8º-C; e
2. Justa causa (arts. 8º-B e 8º-C):
Art. 8º-B
§ 1º Considera-se caracterizada a justa causa nas seguintes hipóteses:
I - inadimplemento do usuário;
II - contas criadas com o propósito de assumir ou simular identidade de terceiros para enganar o público, ressalvados o direito ao uso de nome social e à pseudonímia e o explícito ânimo humorístico ou paródico;
III - contas preponderantemente geridas por qualquer programa de computador ou tecnologia para simular ou substituir atividades humanas na distribuição de conteúdo em provedores;
IV - prática reiterada das condutas previstas no art. 8º-C;
V - contas que ofertem produtos ou serviços que violem patente, marca registrada, direito autoral ou outros direitos de propriedade intelectual; ou
VI - cumprimento de determinação judicial.
Art. 8º-C
§ 1º Considera-se caracterizada a justa causa nas seguintes hipóteses:
I - quando o conteúdo publicado pelo usuário estiver em desacordo com o disposto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990;
II - quando a divulgação ou a reprodução configurar:
a) nudez ou representações explícitas ou implícitas de atos sexuais;
b) prática, apoio, promoção ou incitação de crimes contra a vida, pedofilia, terrorismo, tráfico ou quaisquer outras infrações penais sujeitas à ação penal pública incondicionada;
c) apoio, recrutamento, promoção ou ajuda a organizações criminosas ou terroristas ou a seus atos;
d) prática, apoio, promoção ou incitação de atos de ameaça ou violência, inclusive por razões de discriminação ou preconceito de raça, cor, sexo, etnia, religião ou orientação sexual;
e) promoção, ensino, incentivo ou apologia à fabricação ou ao consumo, explícito ou implícito, de drogas ilícitas;
f) prática, apoio, promoção ou incitação de atos de violência contra animais;
g) utilização ou ensino do uso de computadores ou tecnologia da informação com o objetivo de roubar credenciais, invadir sistemas, comprometer dados pessoais ou causar danos a terceiros;
h) prática, apoio, promoção ou incitação de atos contra a segurança pública, defesa nacional ou segurança do Estado;
i) utilização ou ensino do uso de aplicações de internet, sítios eletrônicos ou tecnologia da informação com o objetivo de violar patente, marca registrada, direito autoral ou outros direitos de propriedade intelectual;
j) infração às normas editadas pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária referentes a conteúdo ou material publicitário ou propagandístico;
k) disseminação de vírus de software ou qualquer outro código de computador, arquivo ou programa projetado para interromper, destruir ou limitar a funcionalidade de qualquer recurso de computador; ou
l) comercialização de produtos impróprios ao consumo, nos termos do disposto no § 6º do art. 18 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990;
III - requerimento do ofendido, de seu representante legal ou de seus herdeiros, na hipótese de violação à intimidade, à privacidade, à imagem, à honra, à proteção de seus dados pessoais ou à propriedade intelectual; ou
IV - cumprimento de determinação judicial.
3. Notificação do usuário acerca da exclusão, cancelamento, suspensão ou bloqueio de contas e conteúdos (arts. 8º-B e 8º-C)
Especialistas têm criticado veementemente a MP como uma jogada política para proteção de interesses próprios do chefe do executivo em envolvimentos protagonizados por ele mesmo, seus familiares e apoiadores com bloqueios de conteúdos nas redes sociais. Na prática, a MP dificulta a atuação das redes sociais no combate às fake news e contra discursos de ódio, haja vista que estes não constam no rol de justa causa para as ações necessárias decorrentes da moderação.
A MP menciona por diversas vezes a observância à liberdade de expressão, comunicação e pensamento. É cediço, todavia, que não se tratam de direitos absolutos, sendo restringidos por outros direitos, tais como a proteção da privacidade e da intimidade individual, a proteção à honra e à imagem dos indivíduos , o combate à desinformação, aos discursos de ódio e às fake new e a proteção do Estado Democrático de Direito.
Válido lembrar que, para que a MP já possui força de lei, mas para que seja definitivamente convertida em Lei, precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional num período de 60 dias, prorrogável por igual período. já foram ajuizadas Ações Diretas de Inconstitucionalidade provocando o Supremo Tribunal Federal a se posicionar quanto à constitucionalidade da MP.
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